Graças às suas características de dureza e possibilidade de ser trabalhada como lâminas extremamente afiadas, a rocha vulcânica denominada obsidiana era bem valorizada na Idade da Pedra (entre 2,6 milhões de anos atrás e cerca de 3300 a.C.), mas a arte de trabalhá-la só teria começado no fim desse período. Uma nova descoberta mostra que isso pode ter acontecido bem antes, segundo artigo publicado na revista Nature Ecology & Evolution.
Primeiros fósseis
O texto aborda os achados de uma equipe de pesquisadores da Itália, da Espanha, da França e da Alemanha no sítio arqueológico de Melka Kunture (Etiópia). Eles encontraram ali uma oficina de machado de obsidiana dentro de uma camada de sedimento datada de 1,2 milhão de anos atrás.
De acordo com os autores do estudo, trata-se de um exemplo extraordinariamente antigo de modelagem de obsidiana e da única fábrica de machados já datada do início do Pleistoceno.
“Sítios [arqueológicos] descritos como ‘oficinas de knapping’ [talhe experimental de rocha dura por fratura concoidal] são registrados apenas na segunda metade do Pleistoceno Médio e apenas na Europa até agora”, escrevem os pesquisadores no artigo.
Localizadas predominantemente na França e no Reino Unido, as mais notáveis oficinas de machados da Idade da Pedra estavam todas associadas à criação de lâminas de sílex.
Grande padronização
“De um modo geral, a obsidiana é amplamente usada apenas a partir da Idade da Pedra Média”, escrevem os autores do estudo. Em Melka Kunture, no entanto, os pesquisadores encontraram uma antiga camada de sedimentos contendo um esconderijo de 578 ferramentas de pedra, das quais 575 eram esculpidas em obsidiana.
“Mostramos por meio de análises estatísticas que essa era uma atividade focada, que foram produzidos machados muito padronizados e que essa era uma oficina de ferramentas de pedra”, escrevem eles.
Segundo os pesquisadores, “a padronização morfológica” exibida pelos machados é “notável”. Embora não se saiba ainda qual espécie de humano fabricou as ferramentas, a equipe considera que que quem as criou aplicou diligentemente “retoques secundários” e foi altamente “focado na regularização final dos artefatos”.
Conquistar tal homogeneidade exigiria habilidades altamente aguçadas e grande destreza, já que a obsidiana é uma rocha frágil que deve ser trabalhada com muito mais cuidado do que o sílex ou o basalto. “Assim, os fabricantes tiveram de avaliar com precisão a força do golpe para evitar a produção de flocos de pouca utilidade, ou apenas para evitar o esmagamento do núcleo”, observaram os pesquisadores.
A descoberta marca o exemplo mais antigo conhecido de tal oficina, e o primeiro de seu tipo fora da Europa. Para os pesquisadores, os fabricantes de machados “resolveram problemas tecnológicos de pensamento convergente de forma criativa, como efetivamente separar e moldar grandes flocos do vidro vulcânico invulgarmente quebradiço e cortante”.
Fonte:
[Mundo]