Desde o século 5 a.C., estudiosos do sânscrito falham em decifrar um problema gramatical deixado por Pāṇini, gramático indiano conhecido como “pai da linguística”. Porém, a questão foi finalmente solucionada por Rishi Rajpopat, doutorando da Universidade de Cambridge, na Inglaterra.
Em sua tese publicada nesta quarta-feira (14) na revista Apollo—University of Cambridge Repository, Rajpopat decifrou um algoritmo de 2,5 mil anos que permite usar a “máquina de linguagem” de Pāṇini, considerada uma das grandes conquistas intelectuais da história.
Embora o sânscrito já tenha servido durante séculos para comunicar obras de ciência, filosofia e poesia na Índia, hoje ele é falado apenas no país asiático e por somente 25 mil pessoas. Ainda assim, a língua é considerada sagrada pelo hinduísmo e influenciou muitos outros idiomas e culturas ao redor do mundo.
O sistema de sânscrito de Pāṇini inclui 4 mil regras detalhadas só em sua maior obra, a gramática sânscrita Aṣṭādhyāyī. Ela funciona ao inserir a base e o sufixo de uma palavra, formando palavras e frases gramaticalmente corretas após um “passo a passo”.
Contudo, diversos conflitos sobre as regras deixaram estudiosos em dúvida sobre quais delas escolher e afetaram milhões de palavras em sânscrito, tendo sido aplicadas simultaneamente na mesma etapa. Para resolver a bagunça, o próprio Pāṇini ensinou uma meta-regra.
O problema é que, nos últimos 2,5 mil anos, especialistas interpretaram mal essa meta-regra, obtendo um resultado gramaticalmente incorreto. Em uma tentativa fracassada de corrigir a questão, alguns desenvolveram centenas de outras meta-regras, mas Rajpopat mostra que todas elas produziram exceções completamente desnecessárias.
Na verdade, a “máquina de linguagem” de Pāṇini é autossuficiente
Segundo o estudante, o gramático indiano não esperava adições de novas ideias às suas regras. “Quanto mais mexemos na gramática de Pāṇini, mais ela nos escapa”, diz em comunicado Rajpopat, que também é natural da Índia.
Segundo a interpretação tradicional dos estudiosos, a meta-regra dizia que, no caso de um conflito entre duas regras de igual força, a regra que vem depois na ordem serial da gramática venceria.
Rajpopat rejeita isso, argumentando que Pāṇini propôs que se escolhesse a regra aplicável ao lado direito da palavra. Empregando essa interpretação, o estudante teve como resultado palavras gramaticalmente corretas, quase sem exceções.
A descoberta torna possível “derivar” qualquer palavra sânscrita e construir diversas palavras corretas, incluindo “mantra” e “guru”. Por exemplo, na frase Jñānaṁ dīyate guruṇā (“O conhecimento [jñānaṁ] é dado [dīyate] pelo guru [guruṇā]”), encontramos um conflito de regras ao derivar guruṇā.
A derivação começa com “guru + ā.” Uma regra é aplicável à parte esquerda (“guru”) e outra à parte direita (“uma”). Devemos escolher a regra aplicável à parte certa, ā, que nos dá a forma correta, guruṇā.
A descoberta de Rajpopat foi descrita como revolucionária por estudiosos e pode servir para ensinar a gramática de Pāṇini a computadores pela primeira vez. O estudante destaca que cientistas da computação que trabalham com processamento de linguagem desistiram de abordagens com regras há mais de 50 anos.
“Portanto, ensinar os computadores a combinar a intenção do falante com a gramática baseada em regras de Pāṇini para produzir a fala humana seria um marco importante na história da interação humana com as máquinas, bem como na história intelectual da Índia”, diz.
Fonte:
[História]
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