Nova técnica de edição de DNA poderá curar até ‘89% das doenças genéticas’ no futuro
A tecnologia, conhecida como “prime editing” (“edição de qualidade”, em tradução livre), foi descrita como uma espécie de “editor de texto genético” capaz de reescrever o DNA com precisão.
Em teste de laboratórios, a nova tecnologia foi usada para corrigir mutações que causam doenças. Uma das mutações que a técnica conseguiu corrigir foi a da anemia falciforme.
Como o ‘prime editing’ funciona?
Uma pesquisa publicada nesta semana na revista científica Nature mostra como os cientistas usaram o método para inserir ou deletar seções de DNA.
O “prime editing” também é capaz de corrigir seções menores, como uma única “letra” das três bilhões que formam o código genético humano.
“Você pode imaginar os ‘prime editors’ como processadores de palavras, capazes de procurar por um alvo entre as sequências de DNA e substituí-lo com precisão”, afirma o bioquímico David Liu, um dos pesquisadores.
“Os ‘prime editors’ oferecem mais flexibilidade para encontrar um alvo e maior precisão na edição.”
O método pode ser ilustrado comparando-o com a edição de texto no computador: é algo como pressionar Ctrl-F para encontrar uma parte do texto que você quer mudar e depois pressionar Crtl-V para colar o texto novo que você quer inserir.
A tecnologia usa uma sequência de código genético feita em laboratório. Essa sequência tem duas funções: uma, é encontrar a parte do DNA que você quer editar, e a outra, é introduzir as mudanças que você quer fazer.
Essa sequência é combinada com uma enzima chamada transcriptase reversam, que “copia” as edições para o DNA.
Como o método pode curar doenças?
O DNA tem quatro componentes básicos, as bases nitrogenadas: adenina, citosina, guanina e tiamina. Elas são conhecidas por suas letras A, C, G e T.
Três bilhões dessas letras formam o nosso DNA, ou seja, o “manual completo” para desenvolvimento e funcionamento do corpo. Mas erros minúsculos causam doenças e transtornos.
A forma mais comum de anemia falciforme (doença hereditária causada pela alteração anatômica dos glóbulos vermelhos), por exemplo, é causada por uma mutação que torna um A específico em um T.
A doença de Tay-Sachs, que afeta os nervos e é fatal, com frequência é causada por uma mutação que adiciona quatro letras extras de código no DNA.
O “prime editing” foi usado com sucesso para corrigir esses dois erros genéticos em experimentos feitos em células humanas no laboratório.
Existem cerca de 75 mil mutações que causam doenças nos seres humanos. David Liu estima que o “prime editing” tem o potencial para corrigir 89% delas.
Os outros 11% incluem situações em que a pessoa tem cópias demasiadas de um gene (uma seção de DNA responsável por uma instrução específica) ou quando um gene inteiro está faltando.
“O ‘prime editing’ é o começo, em vez do fim da longa aspiração das ciências que lidam com vida molecular por serem capazes de fazer qualquer mudança no DNA em qualquer posição em uma célula viva ou um organismo, incluindo, em potencial, pacientes humanos com doenças genéticas”, diz Liu.
Quanto tempo até a tecnologia estar disponível?
O grande desafio agora é conseguir viabilizar que o maquinário molecular capaz de fazer essas edições possa acessar corretamente as partes certas do corpo humano de forma segura.
É provável que as primeiras aplicações sejam feitas em doenças em que seja possível retirar células do corpo, editá-las, garantir que elas são seguras, e colocá-las de volta.
Isso é aplicável no tratamento de doenças do sangue, como anemia falciforme e as talassemias, em que a medula óssea pode ser removida e colocada de volta.
“Nós somos capazes de ‘corrigir’ mutações humanas associadas com doenças, mas a habilidade de fazer isso no tipo certo de célula e de uma forma que seja aplicável em um tratamento clínico vai demorar algum tempo”, diz a bióloga molecular Hilary Sheppard, da Universidade de Auckland.